Nota de repúdio do COEPIR
16 de abril de 2020 - 14:39
CONSELHO ESTADUAL DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL DO CEARÁ – COEPIR
NOTA DE REPÚDIO
O Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial do Ceará (Coepir) reconhece o valor da Capoeira como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, por ser uma manifestação de resistência e resiliência da Cultura Africana remanescente em nosso País. Segundo o IPHAN, a Capoeira “é um elemento estruturante de uma manifestação cultural, espaço e tempo, onde se expressam simultaneamente o canto, o toque dos instrumentos, a dança, os golpes, o jogo, a brincadeira, os símbolos e rituais de herança africana – notadamente banto – recriados no Brasil”.
A Capoeira é e sempre foi uma construção de identidade histórica, uma cultura de princípios civilizatórios de matriz africana que une oralidade, ancestralidade, circularidade, musicalidade, ludicidade, religiosidade, memória e solidariedade ao movimento físico corporal e transmite esses ensinamentos através das vivências e de seu axé. Apresenta-se como ação afirmativa de preservação de uma cultura africana e afro-brasileira dentro e fora das escolas por meio da Lei n° 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira em todas as escolas das redes públicas e privadas do Brasil. Acreditamos que esse ensino só se dará de forma saudável e positiva por meio do diálogo sobre as matrizes africanas numa filosofia envolta em princípios do bem comum, da tolerância e na integração a partir das diferenças, sem discriminação e nem apologia à violência, princípios presentes na Filosofia Africana de Matriz Bantu, Ubuntu, que propõe uma compreensão comunitária sobre a humanidade ” Eu sou porque nós somos”.
Sendo assim, viemos por meio desta Nota de Repúdio manifestar a nossa repulsa às declarações postadas em redes sociais no ultimo dia 13 de abril de 2020, pelos Mestres de Capoeira, Maythor, Zebrinha e Tereza Veras. Os referidos capoeiristas são autores de diálogos aversivos indicando repulsa e ódio, provocando e insuflando agressividade e, o pior, ameaçando a terceiros em suas falas.
Ocorre nas falas dos acima citados uma notória observância conservadora que prega abertamente a misoginia e socialmente o preconceito, além de traços visíveis de tendência para o exercício de forte controle autocrático ou ditatorial, ou seja, o fascismo, além da desconstrução do enraizamento da Capoeira com as Matrizes Africanas no Brasil. As falas dos mesmos apresentam visível e abertamente uma proposta de agressão física e morte em praça pública a pessoas que tem posicionamentos políticos diferentes dos seus. Tais declarações, em rápida comparação, remontam à Inquisição que foi criada no século XIII na Idade Média e funcionava como um tribunal religioso que condenava todos aqueles que eram contra os dogmas pregados pela Igreja Católica ou que eram considerados uma ameaça às suas doutrinas.
Ocorre que tais declarações não se coadunam com a história e a Memória da Capoeira brasileira e cearense, mostrando apenas amplo preconceito e visível violência gratuita. Por esta razão não concordamos e repudiamos veementemente essas falas.
Estamos atentos às atitudes dessa natureza e não toleraremos em nenhuma hipótese tais práticas. Solicitamos uma posição do Fórum Estadual da Capoeira do Ceará sobre este tema, assim como encaminhamos às instituições como a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB Ceará, o Ministério Público do Estado do Ceará – MPCE e da Ouvidoria Estadual de Direitos Humanos para o acompanhamento junto a esta pauta.
Fortaleza – Ceará, 14 de abril de 2020.
Ogan Luiz Leno Farias
Presidente do COEPIR