Marco Vivo: povo Jenipapo-Kanindé celebra 21 anos de demarcação da terra

9 de abril de 2021 - 08:53

Assessoria de Comunicação da SPS
Texto:
Sheyla Castelo Branco
Fotos: Iago Barreto/Divulgação

Debaixo das mangueiras do “tio Odorico”, diversas gerações do povo Jenipapo-Kanindé se reúnem, todo dia 9 de abril, dentre rodas de conversas, músicas e danças para realizar o ritual do toré e a plantação do tronco da yburana. É a festa do Marco Vivo, tradição que se iniciou em 1999, ano em que foi delimitado o mapa das terras Jenipapo Kanindé e tem esse nome por representar a resistência e reafirmar a identidade deste povo. A aldeia fica na comunidade da Lagoa Encantada, no município de Aquiraz. Neste ano, devido à pandemia e aos cuidados para evitar a proliferação do coronavírus, a celebração será fechada só para a comunidade, mas é possível assistir a festa através da transmissão ao vivo pelo instagram @aldeia_jk.

Cacique Pequena (75) e sua neta Carline (33) compartilham suas experiências e falam sobre esta tradição que atravessa gerações há mais de duas décadas no Ceará. Referência na luta indígena, dona Maria de Lourdes – a Cacique Pequena – foi a primeira mulher reconhecida como cacique no Brasil, quebrando a tradição da sucessão masculina nas aldeias.

“O Marco Vivo representa a resistência do povo Jenipapo Kanindé. Sempre lutei pelos nossos direitos e hoje temos escola, água tratada, posto de saúde e não deixamos nossas raízes morrerem. Eu sei que essa minha luta não morre comigo. Ela renasce em cada criança indígena desta comunidade. Eu digo isso, porque vejo de perto que as novas gerações têm tomado para si as causas da comunidade e têm também ido desbravar outros espaços para além da aldeia”, explica orgulhosa, ao tempo em que também agradece aos encantados e ao Pai Tupã. Cacique Pequena é mãe de 16 filhos, tem 57 netos, 15 bisnetos e foi em 2010 nomeada Guardiã da Memória da comunidade. Em 2015, foi reconhecida Mestre da Cultura.

Carline Alves é educadora e monitora do Museu Indígena Jenipapo-kanindé. Ela conta que as tradições estão ainda mais fortes na sua geração e a ideia é seguir fortalecendo essa conexão com a terra e com os rituais que vêm de muito longe e que são símbolo da resistência dos povos indígenas. “Aqui nós temos uma juventude engajada, que saiu para estudar e se formar, e agora está aqui, voltou para suas raízes. Estão atuando como biólogos, museólogos e em muitas outras profissões. Eu fico encantada e cheia de orgulho de ver que essa geração que veio depois da minha, segue valorizando sua ancestralidade e sai da aldeia porque quer voltar com algo para oferecer à comunidade”, pontua Carline, que se emociona ao falar das novas gerações do povo Jenipapo-Kanindé. “Nossos curumins estão sempre participando dos rituais, fazemos questão de que participem de tudo desde muito novinhos, ainda quando estão sendo amamentados”, acrescenta a educadora.

Pertencimento e identidade
Para a titular da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS), Socorro França, o ritual do Marco Vivo guarda em si o significado do pertencimento. “A terra da Lagoa Encantada é do povo Jenipapo-Kanindé e esse sentimento de pertença é o que fortalece ainda mais a identidade deles enquanto povo. Em meio a tantas perdas e a luta para vencermos esta doença, tenho a alegria de dizer que toda esta comunidade já está vacinada e que nós temos muito a aprender com os povos tradicionais. E aqui eu falo não só da resistência física, mas também cultural, dos costumes e tradições que não foram apagados pelo tempo”, destaca a gestora.

Mais de 90% da população indígena já foi vacinada com a primeira dose, e mais de 80% com a segunda dose. Os dados são da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa).

Fotos: Iago Barreto